segunda-feira, 22 de julho de 2013

O "grande negócio" da Eletrobras e da Caixa no Amapá

Em 31 de dezembro de 2012, "tendo em vista as manifestações da Secretaria do Tesouro Nacional e da Procuradoria-Geral da Fazenda", o governo publicou no Diário Oficial uma autorização para que a Caixa Econômica Federal empreste R$1,4 bilhão ao governo do Amapá. Os recursos têm como destino o "saneamento econômico-financeiro" da Companhia de Eletricidade do Amapá, a CEA.

Antes, em novembro, a Eletrobras - controlada pelo governo federal, dono da Caixa - havia assinado um protocolo de intenções para "federalizar" a CEA.

Sorrisos na assinatura de acordo para que Eletrobras assuma a CEA


Segundo um ranking elaborado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), o órgão regulador do setor elétrico brasileiro, a CEA era em 2012 a segunda pior distribuidora do país entre as companhias de menor porte. Perde apenas para a Iguaçu, que abastece alguns municípios de Santa Catarina.

A CEA está sediada no Macapá, capital do Amapá, e tinha o governo local como controlador. Tinha, porque a empresa, que atende cerca de 170 mil unidades consumidors e fatura algo como R$350 milhões por ano, já teve aprovado pela ANEEL um pleito para que a gestão passe a ser compartilhada com a Eletrobras.

Segundo o presidente da CEA, José Ramalho de Oliveira, a empresa só deve voltar a ter lucro em 2017. Assim, a "aquisição" não deve melhorar o balanço do braço de distribuição da Eletrobras, que controla Amazonas Energia, Ceal, Cepisa, Ceron, Boa Vista Energia e Eletroacre. Essas concessionárias acumularam prejuízo de R$1,33 bilhão em 2012.

SITUAÇÃO COMPLICADA
O contrato de concessão que colocou a CEA como responsável por fornecer energia para o Amapá foi prorrogado por 20 anos em 1995. Mas o documento nunca chegou a ser oficialmente assinado. Desde então, a própria Procuradoria Federal na ANEEL admite que a empresa está num "estado imperfeito ou precarizado, pela não formalização" do contrato.

Mas antes o problema da CEA fosse só o contrato em branco. Até o início de julho, a empresa tinha uma dívida de R$359 mil com o Ministério de Minas e Energia e outra de R$1,35 bilhão com a Eletronorte - que pertence à Eletrobras. Há, ainda, outros R$75 milhões em dívidas com o setor elétrico. Pelas regras da ANEEL, empresas inadimplentes ficam proibidas de reajustar as tarifas. Com isso, a CEA pratica a mesma tarifa desde 2004 - o que, obviamente, cria um "buraco negro" ainda maior nas contas da empresa.

Edvaldo Santana, da ANEEL: situação só piorou


No dia 16 de julho, a ANEEL aprovou a "gestão compartilhada" da CEA pela Eletrobras e pelo governo do Amapá. Mas as negociações ainda não terminaram, uma vez que a Eletrobras pretendia ficar com a totalidade ou quase totalidade da empresa. Mesmo tendo a empresa salva com dinheiro federal, o Amapá vem batendo o pé para seguir com uma participação de 20% na CEA.

Ao analisar o caso, o diretor da ANEEL Edvaldo Santana lembrou que agência recomendou ao Ministério de Minas e Energia, ainda em 2007, que fosse declarada a caducidade da concessão. Com isso, seria feito um leilão para encontrar uma nova empresa que aceitasse administrar a rede de energia do Amapá.

Na época, a CEA tinha dívidas de cerca de R$286 milhões e já sofria, segundo Santana, com "patrimônio negativo por sucessivos prejuízos, sistemática inadimplência com fornecedores e perdas de energia insustentáveis". Ainda assim, o diretor da ANEEL disse que "não se percebeu nenhuma melhoria na situação" desde então.

Assim, Santana admitiu que não via "nenhuma alternativa" que não aceitar a gestão compartilhada com a Eletrobras, destacando que a estatal era ela mesma uma credora da CEA. O diretor também apontou que segue em vigor a recomendação para que o governo acabe com a concessão da empresa. "É importante deixar claro que tal decisão não está sendo revista".

SITUAÇÃO INSUSTENTÁVEL
A inexplicável falta de ação do Ministério de Minas e Energia quanto à CEA tornou a situação da empresa mais do que insustentável. Não só para ela, mas para o setor elétrico brasileiro como um todo.

Juro que não sei o que esta imagem está fazendo neste texto...

O Amapá não fazia parte do Sistema Interligado Nacional - a rede de linhas de transmissão que liga quase todos Estados do País, exceto a região Norte, conhecida como "Sistemas isolados". Com a construção de um linhão de energia que passa por Tucuruí (PA), Manaus (AM) e Macapá (AP), a região passaria a fazer parte do SIN.

A questão é que, para receber esse linhão, a CEA precisaria investir em reforços na rede local. E a empresa, é claro, não tinha a mínima condição de fazer os aportes necessários, o que apressou a busca por uma "solução" dentro do governo.

Segundo o governador do Amapá, Camilo Capiberibe, a CEA usará R$1,2 bilhão do empréstimo obtido com a Caixa para quitar dívidas. Outros R$200 milhões vão viabilizar as obras na rede.

Outra dor de cabeça vinha sendo causada pela CEA em leilões para a contratação de energia. Prevendo que seria conectada ao sistema, a empresa participou de certames que contrataram antecipadamente a geração de usinas eólicas e hidrelétricas. Após esses leilões, os investidores responsáveis pelos projetos de usinas usam os contratos assinados com os compradores para obter financiamentos junto ao BNDES.

Mas o "nome sujo" da CEA e o fato de que a empresa sequer possui contrato de concessão assinado fizeram com que a mera presença dela na lista de compradores da energia travasse a concessão dos empréstimos. A ANEEL precisou intervir e excluiu a empresa dos leilões dos quais ela havia participado, dividindo a energia comprada por ela entre outras empresas participantes das licitações.


E AS CONTAS
Como já foi dito aqui, a CEA está com a tarifa congelada desde 2004, o que coloca ainda outra pulga atrás da orelha da ANEEL. Isso porque a empresa está na iminência de pagar suas dívidas setoriais, com a entrada da Eletrobras e o dinheiro da Caixa. Caso isso aconteça, a recomposição da tarifa da concessionária representaria um aumento médio de 133% nas contas para os consumidores do Amapá.

A ANEEL já aponta que, caso a companhia se regularize, será preciso analisar uma solução para "minimizar os impactos" para os clientes.

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