quarta-feira, 12 de março de 2014

Governo tenta desenterrar um esqueleto do setor elétrico enquanto enterra outro



O governo publicou na última sexta (7) um decreto que permitiu ao Tesouro cobrir, mais uma vez, um buraco causado no setor elétrico por falhas na Medida Provisória 579/12, que renovou concessões do setor elétrico e reduziu em 20% as tarifas de energia. Para evitar um reajuste extraordinário das tarifas de energia que poderia comprometer muito do desconto dado, o Tesouro liberou mais R$1,2 bilhão para a Conta de Desenvolvimento Energético, um fundo setorial que desde 2013 passou a ser o cofre de onde saem os recursos para todos subsídios dados ao setor elétrico.

Em 2013, R$9,5 bilhões já haviam sido diretamente repassados pelo Tesouro à CDE. Neste ano, o governo já separou R$9 bilhões com esse fim e os temores são de que o dinheiro não baste. No momento, o desafio do Tesouro tem sido encontrar cada vez mais recursos para cobrir essa conta.

As agências de rating pressionam de um lado, temendo uma redução do já magro superávit primário; o IPCA do outro, com o governo segurando os preços administráveis em patamares artificialmente baixos - como tem sido feito com a gasolina, bancada pela Petrobras, e a eletricidade, na qual Tesouro e Eletrobras contribuem.

Na imprensa começam a pipocar boatos de que já há gente no comando de Brasília falando em alterar mais uma regra do setor, a de formação dos preços do mercado spot de energia, para reduzir a conta. Em on, o governo diz apenas que arrumará uma solução para o imbróglio até abril, quando acontece mais uma liquidação das contas do mercado de energia - ocasião em que, se não houver resposta, o Tesouro precisará comparecer com novo aporte.

Ainda que se feche a torneira, porém, e se tire um dos esqueletos do setor elétrico de dentro do armário, parece que ao mesmo tempo o governo está apenas enterrando outro esqueleto em outro lugar. Afinal, os R$10,7 bilhões que o Tesouro já despejou no setor elétrico - que podem chegar a R$20 bi se o reservado para este ano for usado e mais que isso se ouvirmos as previsões mais alarmantes - terão que ser pagos em algum momento.

O decreto que autoriza a CDE a fazer desembolsos para subsidiar as tarifas também diz que esses recursos terão que ser devolvidos pelos consumidores em até cinco anos - corrigidos pelo IPCA, que ronda a casa dos 6%. Além disso, a primeira parcela da conta já foi adiada de 2014 para 2015. Em algum momento, esse repasse será feito para as tarifas. Se só o IPCA já soma 6% ao ano à fatura e o total não para de crescer, a onda, quando vier, pode dar mais um chacoalhão no setor elétrico. E até causar algum incômodo na inflação.

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Os "encostos" de Delfim: baixa taxa de retorno em hidrelétricas obriga Eletrobras a fazer "leilões pós-leilão"

Delfim não é pastor, mas vê muitos encostos no Brasil

O ex-ministro da Fazenda Delfim Netto, visto como um "conselheiro informal" na política econômica desde os tempos de Lula, afirmou em artigo recente no Valor Econômico que "os maus encostos se multiplicaram" na economia brasileira. O economista não se refere a maus espíritos, mas sim à mania do governo de forçar a associação de empresas privadas com estatais em praticamente todos projetos de infraestrutura.

No setor rodoviário o encosto é o DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes); no ferroviário, a Valec; e "no setor de energia elétrica, tudo depende do 'encosto' da Eletrobras", enquanto em petróleo as entidades que assombram os investidores privados são a Petrobras e o "encostinho" da Pré-Sal Petróleo S. A.. Mas não para por aí... ainda há a Infraero no transporte aéreo e o BNDES e demais bancos estatais no crédito.

A teoria foi comprovada nesta semana, com a abertura, pelaa Eletrobras Eletronorte, de uma chamada pública em busca um ou mais sócios para a hidrelétrica de Sinop, na qual detém 49% junto à Chesf, também do Grupo Eletrobras. Eventuais novos investidores precisarão, inclusive, serem majoritários, uma vez que a estratégia da estatal é manter mais de 50% do empreendimento em mãos privadas para escapar da burocracia da Lei 8.666/93, que rege a contratação por empresas públicas.

A ironia é que a UHE Sinop praticamente acabou de ter a concessão ofertada em leilão público pelo governo federal, no qual houve grande disputa. O leilão A-5 que incluiu a usina foi realizado em 29 de agosto de 2013. Na coletiva de imprensa em que era anunciado o resultado da concorrência - vitória de Eletronorte, Chesf e Alupar como sócias em um consórcio - houve grande constrangimento. Isso porque a Alupar mal esperou o início do pronunciamento da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) para anunciar publicamente, em ofício à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que estava fora do projeto.

Segundo a Alupar, o lance final por Sinop - tarifa de R$109,40 por MWh, com deságio de 7,3% sobre um teto de R$118 por MWh - não garante uma atratividade adequada aos seus padrões. Para piorar a situação, a companhia anunciou a desistência mesmo com os cofres cheios: a Alupar levantou R$800 milhões em uma oferta inicial de ações na Bovespa.

A história - praticamente um leilão pós-leilão - lembra a licitação da polêmica hidrelétrica de Belo Monte. Na ocasião, desenhava-se um certame sem concorrência, com apenas um grupo interessado. Na última hora, porém, a Eletrobras costurou uma aliança com uma série de pequenas construtoras e com o Grupo Bertin, que ficou com 10% da usina. Logo após o leilão as empreiteiras começaram a zarpar fora do negócio - não sem antes garantirem um contrato para tocar parte da obra bilionária da hidrelétrica. Pouco depois foi a vez de a Bertin sair e negociar sua parcela no empreendimento com a Vale.

Daí em diante a história da Bertin no setor elétrico foi pura decadência: atrasos e desistências de projetos, calores e um golpe no mercado de comercialização que hoje deixa uma dívida de R$72 milhões junto à Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) - (sem contar mais de R$150 milhões em multas que a empresa constesta).

Os leilões "direcionados" pela Eletrobras - que fazem analistas do mercado acusarem a estatal de praticar "taxa patriótica de retorno" e afastar o investimento privado - acontecem enquanto o governo tenta apaziguar os ânimos do setor privado, em meio a desconfiança mútua.

A questão que se coloca é se há algum ganho em assegurar a presença da Eletrobras em praticamente todos novos projetos hidrelétricos do país, mesmo às custas de taxas de retorno baixas ou até prejuízo - e em um contexto em que há interesse de investidores privados em tocar sozinhos os empreendimentos. Para citar novamente Delfim Netto: "sem dogmatismo e para dar o benefício da dúvida: alguém pode afirmar com segurança que eles (os 'encostos') ajudaram o bom andamento dos investimentos em infraestrutura que deixamos de fazer nos últimos 30 anos?".
























quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Vencedores do leilão de transmissão são empresas que colecionam atrasos ou estreantes no setor

O leilão de transmissão realizado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) nesta quinta (14/11) colocou à disposição dos investidores 13 lotes de obras a serem construídas em diversos Estados brasileiros. Desses projetos, três não atraíram o interesse de nenhuma companhia. Outros sete foram arrematados por consórcios formados por oito empresas com grandes atrasos na construção de linhas. Outros dois ficaram com a Braxenergy - uma empresa que tem uma série de projetos de usinas solares no papel e nenhuma LT em operação. O último lote ficou com a estatal chinesa State Grid, uma gigante do setor elétrico mundial que tem aumentado as apostas no Brasil.


O que o resultado mostra é que os atrasos são regra, e não exceção, na área de transmissão de energia elétrica no Brasil. Um quadro elaborado por este blog com dados da ANEEL mostra que há empresas com atrasos de até 1,5 mil dias. As vencedoras do leilão acumulam entre 27 e 936 dias de atraso em seus empreendimentos, sendo que Abenboa, CEEE, Celg e Furnas são as líderes. 

A tabela também mostra a lentidão da ANEEL para multar os atrasados: uma obra 1,5 mil dias fora de cronograma teve apenas uma multa atribuida. Outras, com 800 ou 900 dias, estão até agora sem punição.

PS: Sem entrar nos motivos dos atrasos e na discussão sobre quem é a culpa, mas fica evidente que há um problema sério na construção de linhas de transmissão no país. A lista apresenta as empresas com mais de 300 dias de atraso, acrescidas de Copel e Eletrosul - por estas terem sido vencedoras do leilão. 

domingo, 10 de novembro de 2013

AES, EDF, EDP, Furnas e ENEX têm interesse em leilão da hidrelétrica Três Irmãos, da CESP



O leilão que escolherá uma nova empresa para operar a hidrelétrica Três Irmãos, que hoje pertence à CESP, atraiu o interesse de grandes players do setor elétrico. A usina é a primeira concessão vencida a ser licitada depois que o governo decidiu prorrogar a concessão apenas de empresas que aceitassem uma tarifa bem menor. O certame está marcado para janeiro de 2014.

A francesa EDF, a americana AES, os portugueses da EDP (que hoje tem como sócio um grupo chinês, a Three Gorges), a estatal federal Furnas e a empresa de operação e manutenção de sistemas elétricos ENEX O&M participaram da consulta pública aberta pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) para estudar como será feito o leilão. (Detalhe: A ENEX, pede uma mudança na regra, uma vez que as atuais exigências da licitação a desclassificam).

Os investidores também se mostram presentes por meio da APINE, associação de empresas geradoras. Além disso, a CESP também pode tentar ficar com o empreendimento.

Nas consultas, porém, todos colocam dúvida sobre o formato do leilão, a remuneração pelo serviço e outros aspectos técnicos. Um dos pontos que preocupa é o ponto de que uma turbina da usina está quebrada. O custo de reparo será incluído na receita?

Apesar de um Grupo de Trabalho formado pelo governo ter estudado desde 2008 como seria feita a renovação ou relicitação das concessões de energia que venceriam a partir de 2012, ainda restam muitas dúvidas sobre o leilão de hidrelétricas existentes. Até mesmo questões trabalhistas podem gerar custos para o futuro concessionário. Os sindicatos dos atuais trabalhadores da hidrelétrica querem garantir o emprego das equipes que operam a usina.
A consulta pública da ANEEL ficou aberta até 29 de outubro. A agência reguladora vai precisar correr para cumprir a data prometida pelo governo para o leilão, uma vez que ainda não foi aberta audiência pública sobre o edital da licitação.

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Tesouro já banca indenizações a elétricas que renovaram concessões. E faltam no mínimo R$8,9 bi a serem pagos



PS: saldo restante nos fundos ao final de cada mês listado - Clique apara ampliar

O Tesouro Nacional já tem bancado as indenizações que estão sendo pagas às empresas que aceitaram renovar no final do ano passado as concessões de hidrelétricas e linhas de transmissão que venceriam até 2017. O governo se comprometeu a desembolsar R$19 bilhões para essas companhias e mais R$1,7 bilhão para a CESP, que vai devolver a concessão da usina de Três Irmãos.

Desse total em indenizações, R$7,9 bilhões foram dados à vista em janeiro e o restante foi parcelado. Nos últimos meses, a prestação tem ficado na casa dos R$450 milhões. Os desembolsos já feitos somam R$11,8 bilhões.

Faltariam, assim, R$8,9 bilhões, sendo que os recursos da CESP ainda estão em discussão, uma vez que o governo de São Paulo pede ao menos R$3,8 bilhões pelo empreendimento.

Não se sabe se, quando decidido, o pagamento será à vista ou parcelado. O que se sabe é que o dinheiro acabou. Desde julho a Reserva Global de Reversão (RGR), um fundo público, não tem recursos suficientes para arcar com os pagamentos.

A RGR tinha recursos arrecadados por décadas por meio da cobrança de um encargo nas contas de luz com a função justamente de bancar eventuais indenizações a concessionários. Mas parte desse dinheiro foi destinada a cobrir um rombo na CDE, outro fundo do setor. Este estava bancando subsídios dados pelo governo para viabilizar e manter a redução de 20% nas tarifas mesmo em um cenário de forte geração térmica e distribuidoras expostas a elevados preços spot.

A CDE acumulou gastos de R$11,8 bilhões entre janeiro e setembro deste ano. Quando ia ficando sem reservas, entre maio e junho, recebeu R$4,9 bilhões da RGR. Quase ao mesmo tempo, entre junho e setembro, a CDE recebeu aporte de R$6 bilhões do Tesouro Nacional.

Para colocar recursos na CDE, o Tesouro primeiro adiantou R$1,9 bilhão em recebíveis que possuía junto a Itaipu em uma operação com o BNDES. Depois emitiu mais cerca de R$4 bilhões em títulos públicos com vencimentos entre 2014 e 2021.

A CDE ainda precisou passar a cobrir a RGR. Em agosto e setembro, a CDE passou R$270 e 280 milhões, respectivamente, para ajudar a bancar as indenizações da MP 579. Como tanto CDE quanto RGR já estavam praticamente vazias, é o dinheiro do Tesouro que tem pago as empresas que renovaram as concessões.

Para completar, a conta de indenizações deve crescer. A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) ainda não calculou um montante extra que será pago às transmissoras de energia que tinham investimentos ainda não amortizados. A ABRATE, associação do setor, estima o valor em R$15 bilhões.


sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Governo de Goiás quer R$5 bilhões da Eletrobras por participação na falida CELG



Desde 2009 o governo federal tem empreendido um grande esforço para "salvar" a CELG, distribuidora de energia que atende Goiás e pertence ao governo estadual. Até o momento, no entanto, a situação não foi resolvida. A Eletrobras já até comunicou ao mercado que comprará o controle da companhia, mas o negócio não foi selado devido à resistência dos políticos goianos em liberar a venda por um preço que a holding federal aceite pagar.

As conversas para que a Eletrobras assumisse a empresa chegaram a um acordo em 2011, pelo qual a estatal federal ficaria com 51% da distribuidora goiana. Em maio deste ano, a compra foi aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que inclusive sugeriu multar a Eletrobras em R$888 mil devido ao atraso na notificação sobre o negócio.

Nesta sexta-feira (1/11), no entanto, matéria no jornal local O Popular apontou que ainda não há um acordo sobre o valor a ser pago pela Celg-D. A Eletrobras se propôs a fazer uma aquisição simbólica, por R$1 e mais uma promessa de investimentos superiores a R$1 bilhão. A companhia teve apoio da auditoria Deloitte na proposta. Mas o governo de Goiás discorda e se baseia em laudo da Universidade Federal de Goiás que aponta um preço de ao menos R$4,9 bilhões pelo ativo.

O assunto foi discutido em reunião com o ministro Edison Lobão, o presidente da Eletrobras, José da Costa Neto, o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, e o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB).

A operação de salvamento da CELG começou ainda no governo Lula, e se tornou uma novela. A companhia, que opera em um mercado em expansão, conseguiu acumular uma dívida bilionária que aumentou 250% somente entre 2003 e 2008, segundo estudo do Tribunal de Contas do Estado de Goiás.

Em 2010, foi articulado um empréstimo de R$3,7 bilhões da Caixa Econômica Federal para a companhia, que acumulava à época mais de R$5 bilhões em dívidas. O acordo, no entanto, "melou"  no final do ano. "Por dificuldades de natureza política às quais nem quero me referir", segundo o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão. A imprensa, porém, atribuiu o problema à eleição do candidato tucano Marconi Perillo na eleição para o governo de Goiás.

Sem apoio federal, Goiás tentou uma reestruturação com o apoio do banco Credit Suisse, mas a única solução foi voltar a estender o chapeu para o governo federal, que acertou a entrada da Eletrobras no negócio em 2011.

A CELG é uma das distribuidoras que tem o contrato de concessão com vencimento em 2015. O governo federal ainda não decidiu como e quando será feita a renovação ou extinção dessas concessões. A Eletrobras também tem concessões de distribuidoras para vencer no mesmo ano. No caso da holding, o problema é que as companhias acumulam prejuízos bilionários ano após ano. O Santander foi contratado para encontrar um modelo de venda dos ativos, mas a operação está em compasso de espera, uma vez que não é atrativo vender as empresas sem uma definição sobre os contratos.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Sugestões de leitura da semana

Entre notícias de energia, macroeconomia e até coisas aleatórias, tentarei colocar aqui algumas sugestões, a exemplo de alguns blogs que sigo (Drunkeneysian, principalmente). Ajuda a não deixar morrer o blog enquanto não tenho tempo para escrever.

Créditos de Itaipu criaram atrito entre BNDES e Eletrobras (Valor Econômico)

Solar vs wind in Brazil A-5 tender (Recharge News)

Elétricas deixam de investir R$500 milhões devido a indefinição (Estadão)

Boom do xisto pode ter vida curta (Valor Econômico)

Geradoras europeias pedem fim do incentivo a energia renovável  (Brasil Econômico)

Dívida bruta no radar (Estadão)

Uma virada liberal de Dilma? (Estadão)