quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Grandes consumidores de energia perdem a paciência com o governo após ver desconto nas tarifas bem menor que o esperado

Paulo Pedrosa, da ABRACE

A ABRACE, associação que reúne indústrias que usam muita energia em seus processos de produção, recorreu ao diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), Romeu Rufino, contra uma mudança que de regra que coloca todos consumidores para pagar parte dos custos de termelétricas que foram ligadas no Nordeste em setembro.

Os 800 MW em usinas estão acionadas "fora da ordem de mérito", ou seja: os modelos matemáticos que guiam a geração de preços do sistema elétrico brasileiro não apontam para a necessidade de utilizá-las, mas o Operador Nacional do Sistema (ONS), órgão que gere a rede, avalia que é necessário despachá-las por algum motivo.

Até setembro, elas foram bastante utilizadas por "segurança energética" - a redução do risco de racionamento. Depois desse mês, um novo modelo de cálculo de preços passou a operar. Os novos critérios são conservadores e evitam os riscos de racionamento enquanto possível. Com isso, mais usinas passaram a ser ligadas "pela ordem de mérito", por ordem do modelo matemático.

Ainda assim, o ONS viu riscos ainda maiores que o modelo e ordenou o acionamento de mais térmicas no Nordeste. O órgão alegou que queimadas recentes na região obrigam a uma operação mais conservadora dessas usinas - mas não "por segurança energética" e sim devido a restrições na rede local. A questão é que esse critério faria, pelas regras do setor elétrico, com que esse custo térmico fosse bancado só pelos nordestinos, o que ficaria salgado para as contas locais.

Em cima da hora, a ANEEL abriu uma audiência pública para discutir a mudança do rateio. Este poderia ser feito entre todos, desde que fosse visto risco para o sistema no caso de um blecaute numa região. A nota técnica que abre a discussão determina que a nova divisão de custos seja feita retroativamente, desde setembro. Posteriormente, se a diretoria ouvir a posição dos envolvidos e fizer alguma mudança nas regras, será feita uma "recontabilização" da parte de cada um na conta e os valores pagos a mais devolvidos por eventuais prejudicados.

A ABRACE tentou suspender a validade da aplicação imediata da regra, pedindo ao diretor-geral do órgão regulador por efeito suspensivo - que pode paralisar a validade de um ato da ANEEL caso seja vista "fumaça do bom direito" ou perigo de perdas que depois serão irreparáveis. O pedido foi negado por Romeu Rufino em despacho publicado no Diário Oficial da União de hoje (9/10).

GRANDE CONSUMIDOR PERDE A PACIÊNCIA
Os grandes consumidores de energia perderam a paciência com o governo depois de verem frustrada a expectativa de redução significativa no preço do insumo após o pacote de medidas nesse sentido lançado pela presidente Dilma em setembro de 2012. Embora a União já tenha gasto R$21 bilhões, com emissão de R$6 bilhões em dívida e adiantamento de R$1,9 bilhão em recebíveis junto ao BNDES, os subsídios à eletricidade não chegaram aos associados da ABRACE.

A entidade alega que teve um barateamento de, na prática, 7,5%. A diferença em relação aos 20% experimentados por enquanto pela média dos consumidores menores se dá porque a energia das usinas que renovaram os contratos para fornecer a tarifas muito menores vão direcionar toda a produção para o mercado de baixa tensão.

Os consumidores do mercado livre, como os da ABRACE, tiveram somente a redução de encargos e custo de transmissão. Além disso, pagam parte do custo das termelétricas que garantiram que o país não passasse por um racionamento no final de 2012 e em 2013.O governo tentou, assim como foi feito agora com as térmicas do Nordeste, mudar as regras de rateio. E mudou, com uma Resolução do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).

Mas a chamada "CNPE 3" foi derrubada na Justiça pela maior parte das empresas que foi colocada para pagar a fatura. E o custo voltou para os consumidores, o que serviu de estopim para a insatisfação da ABRACE, noticiada no Canal Energia.

"Entramos na justiça como se fosse um grito de basta, de desabafo, no sentido de que não está dando. O setor não está conseguindo nos atender nas condições que nós precisávamos de preço e previsibilidade para competir", explicou Paulo Pedrosa, presidente da associação (o detalhe é Pedrosa foi diretor da ANEEL entre 2001 e 2005, enquanto o diretor técnico da ABRACE, Luciano Pacheco, esteve na agência reguladora entre 1997 e 2001).

Segundo a matéria do Canal Energia, Pedrosa disse ainda: "estamos subindo o tom no sentido de dizer que se os outros estão descontentes, nós também estamos", em referência às críticas gerais do setor elétrico contra todo o processo de renovação das concessões e suas consequências.

RESIDENCIAL PAGA A PARTIR DE 2014
O consumidor residencial também perderá parte do alívio com as tarifas quando tiver que bancar sua parte na conta do custo das termelétricas. Esse valor está sendo coberto neste ano pelo Tesouro Nacional. A ideia é que a partir de 2014 o montante envolvido na operação - R$8 bilhões até agora, de acordo com dados da ANEEL - seja devolvido aos cofres públicos pelo consumidor. A fatura será dividida por cinco anos. Mas deve ter algum peso, uma vez que se somará aos próximos reajustes anuais que serão praticados pelas distribuidoras.

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